3.10.09

Entrevista dada ao - http://www.educacaopublica.rj.gov.br/jornal/materias/0275.html

É possível fazer algo pelos jovens infratores?
Leo Silva
Ao se conversar com o pedagogo Antônio Futuro, a resposta para a pergunta do título é afirmativa. Há cerca de 20 anos envolvido com o atendimento a jovens em conflito com lei, Antônio defende a tese que parte da solução passa pela escola, quer pela atividade docente, quer pelo uso de suas instalações. Neste caso, a escola desenvolveria durante toda a semana suas atividades normais e nos fins de semana sua infraestrutura seria usada para o lazer e o atendimento médico para a população.
Enquanto isso não acontece, Antônio sugere medidas para ajudar os jovens infratores a ter chances de possuírem uma vida mais digna, por meio da melhoria do atendimento no órgão do estado responsável por sua custódia, o Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase).
Pela melhoria no atendimento ...
Segundo Antônio, como a cultura do Degase ainda não mudou, a Instituição acaba potencializando a agressividade do jovem. O professor observa ainda que há iniciativas isoladas para mudar esse quadro, a despeito de resistências dentro da própria Instituição.
Como exemplo de que é possível outra forma de atendimento, o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) cita o exemplo das Organizações Não-Governamentais (ONGs). Neste caso, em que os jovens vão de livre e espontânea vontade, não há rebeliões e eles aceitam as condições impostas. Entre elas, Antônio cita a obrigação de cumprir horários e de tirar os documentos.
Outra observação do professor é que as unidades do Degase servem de escolas do crime, como dizem os próprios internos.
- Porque não experimentam algo diferente há um aumento no nível de agressividade e a inserção definitiva, em muitos casos, nas "relações escusas".
Sugestões de aperfeiçoamento ...
Como forma de tentar reverter esse problema, ele sugere, dentre outras possibilidades, a adoção do programa de liberdade assistida e remunerada para os jovens que cometeram infrações leves. Segundo ele, esse programa poderia pagar a família de R$ 500 a R$ 600 por mês, desde que se atendesse a certas condições.
Aos que são contra esse tipo de iniciativa, ele lembra que um jovem interno custa cerca de R$ 2 mil reais por mês para o Degase. Para Antônio, as pessoas interessadas em melhorar o sistema têm que incentivar práticas cotidianas com os jovens dentro de um projeto pedagógico que promova sua inserção social e a seleção criteriosa dos servidores.
Outro ponto importante para o professor é a fiscalização das atividades do departamento por instituições como a Assembleia Legislativa, Ordem dos Advogados do Brasil e Ministério Público.
Uma Causa...
Como dito antes, a experiência desse professor da Uerj é resultado de uma vida dedicada à causa dos "meninos" como ele os chama. Ainda jovem, ele foi com as pessoas de sua igreja ensinar os jovens internos a andar de skate.
Daí, nunca mais parou, tendo sido membro do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedca) e agente educacional do Degase. Atualmente, além de professor, também é secretário executivo da ONG Criança Rio.
Em 2003, sua dedicação ao tema levou-o a defender a dissertação: Uma análise dos valores e da subjetividade do jovem infrator, no Programa de Pós-graduação em Educação da Uerj.
Condicionantes ...
Em sua dissertação, Antônio procura identificar em que momento se dá a entrada do jovem no cotidiano da infração que vão além dos fatores já conhecidos como: a realidade social, a falta de perspectiva, ruptura com o modelo escolar e estrutura familiar difusa. Neste caso, ele apresenta alguns complicadores que não são pouco comuns na origem desses jovens.
Um exemplo que ele cita é o do pai preso que ao voltar foi viver maritalmente na mesma casa com a mulher e sua companheira. Outro caso é o do pai ou da mãe presos em que o que fica do lado de fora - não preso - arruma outro parceiro.
Por fim, outra possibilidade da entrada do jovem na infração é o do o pai ou a mãe morrerem ou irem presos e o padrasto pôr o menino para fora. Isso obriga o jovem a ter que complementar sua renda na rua para comer.
Com isso ele coloca em dúvida uma opinião comum para população, de que seria possível mandar esses jovens de volta para casa:
- As pessoas quando encontram esse menino na rua falam que a maioria deles tem casa. Tem, é verdade. Ninguém nasce do asfalto. Mais vai lá ver como é!
Ele cita o caso do Conselho Tutelar do Rio, uma das fontes de sua pesquisa, que faz visitas domiciliares para ver qual a possibilidade de reinserção desses jovens na família. Segundo Antônio, um número bastante significativo dessas visitas conclui que é impossível. O resultado é o encaminhamento dos jovens para abrigos municipais, onde eles têm uma oportunidade melhor na condição de vida.
- Esses meninos que estão nos abrigos vão criar algumas condições de vida legais. Estudar, fazer curso, dar uma caminhada. E o que não passa pelo abrigo? Que vive a mesma realidade? Que não tem possibilidade de reinserção familiar diante desse quadro que coloquei para você? Esse menino se vê obrigado a ganhar dinheiro na rua ou no tráfico.
Em sua pesquisa ele constatou que o jovem que ingressa no tráfico não ganha tão bem quanto pensa o senso comum. Apesar de ganhar mais que em um emprego com carteira assinada, segundo Antônio, os que realmente ganham bem são somente os líderes.
O professor lamenta que outro atrativo importante seja o status social que o jovem traficante adquire na comunidade e fora dela. Ele dá o exemplo do tênis da moda:
- Ele pode comprar um Nike de molinha e absurdamente ele será mais bem respeitado, dentro e fora da comunidade, enquanto tem esse tênis. Quando ele vem para cidade ele anda de táxi, tem o Nike de molinha e as meninas ficam a fim dele.
A despeito de saberem que a expectativa de vida é curta, os jovens preferem viver dez anos a mil do que mil anos a dez, como na música de Lobão "Decadence Avéc Elegance", segundo o professor. Para ele, essa atitude reflete uma postura da sociedade.
O professor observa que quando se conversa com as mães ou avós desses jovens infratores, elas não acreditam que eles sejam capazes de fazer esse tipo de coisa. Mas ele mesmo aponta que quando esse jovem entra para o
crime, ele vai despejar todo o ódio que tem.
26/9/2005

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