3.11.15

Em relação ao episódio da Criança que quebra a escola no RJ.
Primeira observação; Repare que a postagem, faz coro a ideia de culpabilizar a família, o que invariavelmente cria a atmosfera de culpa na própria criança, no problema em si, ou seja, desfocando da responsabilização de uma atmosfera de violência social que ecoa na escola, ultrapassa os muros do olimpo, invade nosso espaço outrora intocável, não se trata mais de um problema, como afirmam alguns equivocadamente, que não nos diz respeito. NÃO !!! Se eu trabalho com esta criança e ela vem com estas características, ou seja, machucada, ferida, magoada, insegura... É fato, que; a partir de então, estas características da criança fazem parte de meu trabalho, permeiam minha ação, definem o grau de investimento que vou ter, exigem maior ou menor rigor neste ou naquele caminho, não fui eu quem criou as características da criança, mas elas fazem parte de meu trabalho, portanto este problema, a partir de então, também é meu, ou melhor, incide diretamente sobre o meu trabalho e como tal não poderei desprezá-lo, sobretudo no que diz respeito ao processo de atendimento educacional daquela criança. Não cabe mais a fala equivocada de que; ''Eu não tenho nada com isto''' Tenho sim !!! O Médico cardiologista não sugere que o paciente pare de fumar? Seguindo esta lógica ele deveria falar; ''Este problema não é meu''. Ora ??? Nada mais bizarro !!!
Portanto, entender as características que subjazem a relação com o educando, é sim, problema nosso, o que não significa dizer que nós professores devamos resolvê-los, mas em hipótese alguma negá-los. Assim como também é demasiado equivocado a fala de que não sou educador, sou apenas Professor, como se fosse possível separar estas duas ações, educar é parte do jogo, aliás, consequência óbvia de nossa relação, simples relação entre um adulto e uma criança. Há um provérbio africano que diz: ‘É PRECISO TODA UMA ALDEIA PARA EDUCAR UMA CRIANÇA’’. Seguindo a lógica de que eu não sou responsável pela Educação desta criança, este lindo e pertinente provérbio passa a não ter sentido. Toda a sociedade é responsável pela Educação de uma criança, em especial os Professores.
Segunda observação; Percebe-se claramente que há em nosso campo de trabalho uma fala de que; ‘’não podemos fazer nada’’, aliás, uma voz no vídeo afirma isto claramente. Ouve-se em dado momento,
‘’Deixa, deixa... ‘’
Ali fica implícita a ideia de que haveria, possivelmente por força da lei, um impedimento à nossa intervenção. Há a sensação de impotência, como se não pudéssemos fazer nada, o que definitivamente não é verdade, ouso a afirmar que há implicitamente um tom jocoso em relação ao ECA(Estatuto da Criança e do Adolescente) que notoriamente sofre reação negativa de grande parte da categoria. Venho exaustivamente refutando esta afirmação, não; O ECA não minimiza em nada nossa ação, ao contrário, cria mecanismos interessantíssimos em apoio desta.
Antes que os brados ecoem, faço a pergunta;
- Em que artigo o ECA nos atrapalha?
E por fim... Agora para pontuar categoricamente este embate; É preciso ter a coragem de assumirmos a seguinte questão, De que lado você está? Do lado que luta pela construção de uma sociedade mais justa, em que criemos condições de minimizar as injustiças causadas por um modelo desigual? Ou do lado que entende que as coisas são assim e as pessoas não vencem porque não querem? Esta é a retórica que está posta !!!
Particularmente acredito que as razões que intermedeiam a ação do menino e a reação equivocada dos profissionais envolvidos tenham origem na desigualdade social de nosso país, na falta de condições de trabalho destes profissionais, na falta de esclarecimento dos professores( no que concerne o ECA), que ironicamente navega em terreno de enfrentamento destas desigualdades das quais estes mesmos profissionais da educação são vítimas. E de forma mais dura, é preciso ter a coragem de afirmar;
Temos lado !!!
Acreditamos na mudança e a criança em questão é vitima de um modelo desigual, a ação, corretíssima de sua mãe que busca reparação a exposição da imagem de seu filho, aliás, baseada nas garantias de direitos preconizada no ECA, faz-se oportuna. Sem negar que há que se discutir a negligência, ou não desta mãe, proletária escravizada em uma sociedade capitalista com características fortemente escravagistas e deliberadamente desiguais.
Há que lutar, há que resistir e torna-se imperioso não condenarmos os atores envolvidos, neste episódio, sejam eles: Pais, alunos e Professores, mas sem jamais deixar de reconhecer os erros e, na medida em que os reconhecemos, fazer deste momento um momento de crescimento para todos(as) nós.
Toda força e apoio aos profissionais envolvidos, toda força e apoio a família envolvida e de forma veemente toda força e apoio a criança envolvida.
Que não haja espaço aos conservadores, que não repliquemos a blasfêmia do totalitarismo, que nossa indignação não vire ódio e que toda nossa atenção vire esperança.



Antonio Futuro é Professor da Rede pública Estadual RJ, Ms. em Educação e escreve sobre Juventudes e Violências.

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