30.4.11

Como tudo começou... PARTE I

Aqui neste conjunto de textos, que estou chamando de - COMO TUDO COMEÇOU - PARTE I - pretendo trazer um pouco do histórico da Educação no Brasil. Certamente, que a brevidade deste espaço não me permite aprofundar esta descrição, nem tampouco o aprofundamento acerca das reflexões que aqui surgem. Contudo, creio que este texto possa dar pistas das razões da composição do modelo educacional que ora encontramos no Brasil. Posteriormente darei prossguimento com a Parte II e III.

• INTRODUÇÃO

Como sabemos, um importante fato, dentre muitos, capaz de igualar ou diferenciar homens, é o acesso ao conhecimento. Dessa forma, para que possamos analisar o problema da exclusão social de grande parte da população brasileira, é preciso, como ponto de partida, um olhar sobre o nosso processo histórico. Entre nós, há muito tempo, nega-se ao povo o DIREITO SOCIAL básico de educar-se, principalmente aos jovens e adultos, sobretudo das camadas populares. Ao longo da História do Brasil, surgem medidas de democratização do ensino, configuram-se movimentos em defesa do ensino público, mas, de fato, muito pouco tem sido feito para torná-los efetivos. Nos primeiros tempos, você sabe, de um lado eram os que se proclamavam donos da terra, ligados à exploração dos engenhos; de outro, a maioria dos trabalhadores, submetida ao processo de escravidão. Assim tudo começou.


• A AÇÃO MISSIONÁRIA E EDUCATIVA


No começo era a catequese. Os religiosos da COMPANHIA DE JESUS foram os primeiros responsáveis por uma educação sistemática no país. Fácil imaginar, que o objetivo maior dos jesuítas era o de difundir o Evangelho. Portanto, o primeiro projeto educacional brasileiro não tinha como objetivo a ação de educar. Embora, também ensinassem princípios morais, normas de comportamento e alguns ofícios. Aos poucos, essa ação foi ganhando um contorno mais voltado para a Educação, então esta nova fase foi redesenhada para a educação da classe dominante, representada pelos colonizadores e seus descendentes. Como você vê, o povo estava de fora. A respeito disso, destaca Romanelli (1988, p. 35), “a obra de catequese que, em princípio, constituía o objetivo principal da presença da Companhia de Jesus no Brasil acabou gradativamente cedendo lugar, em importância, à educação da elite”. Mas que tipo de ensino desenvolviam os jesuítas? Ler e escrever, para a maioria da população, e ENSINO HUMANÍSTICO para alguns da classe dominante, ensino esse totalmente afastado da realidade da colônia e seguindo o modelo da cultura européia. É importante destacar que, do início da colonização até 1759, ano da expulsão dos jesuítas, todo o processo educacional e a própria vida social da colônia sofreram pesada influência jesuítica, que persistiu ao longo de nossa História. Associa-se a este modelo o forte traço Pombalino, ou seja, a Educação voltada para as elites brasileiras que dura até hoje tem aqui neste momento histórico um pouco de suas razões. Cabe ressaltar, que esta não é a única razão deste modelo educacional aristocrático, porém este momento de nossa história merece o devido destaque.


• A CORTE CHEGA AO BRASIL

Há um fato interessante em relação ao período compreendido entre a expulsão dos jesuítas (1759) e a chegada de D. João VI (1808)que precisamos destacar. É a REFORMA POMBALINA Reforma Pombalina, de

natureza anticlerical. Essa reforma procurava corrigir o traço formal e religioso do ensino, incluindo o conhecimento científico não aceito pelos jesuítas. Você sabe por que nos lembramos dessa Reforma? Nela não se destaca nenhum avanço na educação popular, e, como se imagina, o processo de exclusão se acentua devido ao fechamento das escolas missionárias. A partir da chegada de D. João VI, começa a se delinear, no Brasil, uma classe média muito atuante, influenciada por correntes de pensamento

ligadas ao LIBERALISMO. Você lembra o que é o liberalismo? Naquele período, essa classe emergente via na escolarização uma forma de se impor e de galgar as posições de mando que a estrutura colonial favorecia. Acentuam-se a estratificação e o distanciamento da imensa classe popular.

A presença da família real forçou a reestruturação social e política do Brasil. Muitas obras públicas, muita movimentação no campo intelectual e muitas benesses para a elite. À grande massa inculta nada se oferecia. Podemos perceber ainda, no período joanino, uma preocupação com o ensino militar e com os cursos superiores. Afinal, era preciso criar a classe dominante, que decidiria o futuro da nação. Dessa forma, nenhuma medida ou ação educativa voltada para os adultos das camadas populares foi, de fato, implementada nesse momento da nossa História. Romanelli, analisando o período, afirma que a preocupação exclusiva com a criação de ensino superior e o abandono total em que ficaram os demais níveis do ensino demonstram claramente, esse objetivo, com o que se acentuou uma tradição que vinha da Colônia – a tradição da educação aristocrática (1988, p. 38).


• INDEPENDÊNCIA OU MORTE – BRASIL IMPÉRIO


(...) E o sol da liberdade
Em raios fúlgidos
Brilhou no céu da pátria
Neste instante. (...)


Fica difícil avaliar o que é ser independente. Afinal, tantos anos depois, nós – e também outras ex-colônias na África e na América Latina – continuamos dependentes de outros países. O tão sonhado “sol da liberdade” continua sendo, para todos, uma meta. Como seria de esperar, após a Independência, as forças políticas se aglutinaram em torno da primeira CONSTITUIÇÃO (1824), que recebeu grande influência européia. Nela, destaca-se que a instrução primária é gratuita e deve ser oferecida a todos os cidadãos; logo, você já concluiu que os adultos também deveriam ser beneficiados. Mas não o foram, como também ficaram excluídos, explicitamente, mulheres e negros. A aplicação da lei foi, portanto, restritiva. Em relação à questão, Haddad e Di Pierro observam que essa distância entre o proclamado e o realizado foi agravada por outros fatores. Em primeiro porque no Império só possuía cidadania uma pequena parcela da população pertencente à elite econômica, à qual se admitia administrar a educação primária como direito, do qual ficavam excluídos negros, indígenas e grande parte das mulheres (2000, p. 109).

Além disso, os autores acrescentam que para completar esse quadro excludente, o Ato Adicional de 1834 deu autonomia às províncias quanto à forma de administrar a educação básica – primária e secundária – em sua jurisdição. O que podemos perceber, então? Transfere-se para quem tem menos recursos a responsabilidade de educar a maioria da população. Era público e notório que faltavam estrutura, bases financeiras e que, principalmente, os professores eram insuficientes. Ribeiro (2000) aponta que, para enfrentar essa carência de professores primários nas províncias, adotou-se o chamado MÉTODO LANCASTER, de influência inglesa. A “vantagem” do método, apregoavam seus defensores, era a de que para cada escola bastava um professor, orientador dos que efetivamente atuavam junto aos alunos em sala de aula, que eram os monitores. Não fica difícil concluir qual era o nível de qualidade desse ensino, não é verdade? Aliás, você deve estar se dando conta de que, em pleno século XXI, ainda temos muitas variações do Método Lancaster. Bem, mas e quanto ao secundário? Essa modalidade atendia um número limitado de alunos, nos chamados liceus provinciais, de caráter PROPEDÊUTICO, que, ao final, acabaram se transformando em preparatórios para exames do curso superior. Novamente verificamos aí uma similitude com o modelo em curso, hoje em nosso país. O governo imperial, para responder aos anseios dos mais aquinhoados financeiramente, estimulava a criação, nas províncias, desses colégios. Insuficientes para atender a demanda, acabaram estimulando o surgimento de cursos e colégios particulares, preparatórios para o ensino superior. Já naquele tempo! Você deve estar curioso e se perguntando: E o ensino profissional? Como seria de esperar, havia certo descaso público e alguma aversão a todo tipo de ensino profissional, sempre destinado aos pobres, aos órfãos e aos pouco escolarizados. Essa visão encontrava apoio em uma sociedade fundada numa ordem social escravocrata.

Uma interessante fonte histórica que traduz a percepção estrangeira quanto ao processo de “ensino de ofício”, destinado pelos senhores de terra aos jovens e adultos escravos, pode ser consultada pela leitura de uma das cartas enviadas por Von Binzer. Preceptora alemã, contratada como professora dos filhos de um abastado proprietário rural, costume comum à época, escreveu, em 1882, a uma amiga na terra natal:

(...) os brasileiros deviam organizar entre seu próprio povo uma classe operária que ainda não possuem, como também criar a classe dos artezãos; alcançariam êsse fim com êxito, se encaminhassem às crianças pretas libertas para exercer um ofício regular. Mas acontece justamente o contrário: a lei de emancipação de 28 de setembro de 1871 determina entre outras coisas aos senhores de escravos que mandem ensinar a ler e a escrever a todas essas crianças. Em todo o Império, porém, não existem talvez nem 10 casas onde essa imposição seja atendida. Nas fazendas sua execução é quase impossível. No interior não há os mestres-escolas rurais como na nossa terra, e assim sendo o fazendeiro ver-se-ia obrigado a mandar selar 20 a 50 animais para levar os pretinhos à vila mais próxima, geralmente muito distante; ou então teriam que manter um professor para essa meninada?...

                                                            (...) mas o fato é que ninguém aqui faz coisa alguma, de  maneira que as crianças nascem livres, mas crescem sem instrução e no futuro estarão no mesmo nível dos selvagens sem gozar nem mesmo das vantagens dos escravos, que aprendem este ou aquele trabalho material. Se já estão livres, por que fazer despesa com êles, esperdiçar dinheiro com quem não dará lucro? (...) não estarão percebendo que, agindo assim, estão preparando a pior geração que se possa imaginar para conviver mais tarde com seus próprios filhos? (BINZER, 1982, p. 102).



2 comentários:

  1. É,bem interessante para reflexão o artigo,como ainda em pleno séc. XXI ainda persiste as nomenclaturas e as atitudes escravocratas com outras siglas...

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  2. A meu ver o método lancaster ainda pode ser visto no ensino primário público: as "professorinhas" devem lecionar todas as matérias para as crianças.

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